Gilles Gomes de Araújo Ferreira

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Direto do túnel do tempo

Elio Gaspari é um idiota e acha que os iranianos estão certos em manter prisioneiros os quinze marinheiros britânicos capturados na sexta-feira 23 de março no Canal de Shatt al-Arab, na fronteira entre o Irã e o Iraque. Gaspari certamente acredita que a incursão dos militares em águas iranianas faz parte de uma invasão ao país dos aiatolás pelos Estados Unidos e pela Grã-Bretanha, prestes a ser executada.

E idiota que é, acredita que estes países já têm soldados escondidos em diversos pontos do Irã, como defendeu o Observer no domingo. Logo, é legítima a denúncia vinda de Teerã de que os quinze marinheiros, além de violadores de soberania, são espiões - um tanto indiscretos, há que se convir, visto que vestiam uniforme e viajavam a bordo de um navio de guerra. Gaspari não é o único. Para alegria dos fanáticos de toalhas na cabeça, os idiotas pululam nas redações.

O Irã afirma que capturou os marinheiros da Royal Navy e da Royal Marines em suas águas, o que constitui uma invasão e legitimaria a detenção. No entanto, o Ministério da Defesa Britânico apressou-se em divulgar a localização em que seus militares foram detidos, valendo-se inclusive de imagens de satélite, e o International Boundary Research Unit confirmou que aquelas eram águas territorias iraquianas.

Pouco depois da detenção, o Irã informou que os britânicos haviam "confessado" a invasão, divulgando em seguida uma carta assinada pela única mulher do grupo, Faye Turney, endereçada aos membros da Câmara dos Comuns. Na carta, Ms Turney escreve que

gostaria que todos vocês soubessem do tratamento que recebo aqui. Os iranianos são gentis, carinhosos e muito acolhedores. Eles não me feriram, mas cuidaram muito bem de mim. Estou sendo alimentada, vestida e cuidada. Infelizmente, durante nossa missão, invadimos águas iranianas. Apesar desse equívoco, eles nos trataram bem e humanamente, motivo pelo qual sou e serei eternamente agradecida. Pergunto aos membros da Câmara dos Comuns, se depois de o Governo prometer que esse tipo de incidente não mais ocorreria, por que ele aconteceu, e por que o Governo não foi questionado sobre isso: "Não é o momento de retirarmos nossas tropas do Iraque e permitir que eles decidam seu próprio futuro?"


Em outra carta, dirigida ao “povo britânico”, Ms Turney afirma ser uma vítima das "políticas intervencionistas dos governos Bush e Blair", e mais uma vez pede a retirada das tropas do Iraque.

Qualquer observador sensato levantaria dúvidas sobre as condições em que foram feitas as declarações de Ms Turney e dos outros marinheiros “entrevistados” pela televisão iraniana. Mas os idiotas preferiram acreditar que a ditadura muçulmana está tratando os “prisioneiros de guerra” a pão-de-ló. Mais, que uma vez em contato com os prodígios da cultura persa, os marinheiros abandonaram os preconceitos ocidentais e aderiram à causa do multiculturalismo e do pacifismo. Na próxima, eles se convertem ao islamismo.

Em 1979 um grupo de estudantes iranianos fez 66 diplomatas e cidadãos americanos reféns na Embaixada dos Estados Unidos em Teerã. Entre os organizadores da invasão estava o representante da Universidade de Ciência e Tecnologia, Mahmoud Ahmadinejad, atual Presidente da República Islâmica do Irã. A situação estendeu-se por mais de um ano, graças à fraqueza do então Presidente Jimmy Carter.

George Savile, Marquês de Halifax, já no século XVII explicava que “não se enforca um homem por ele ter roubado cavalos, mas para que os cavalos não sejam mais roubados”. Tivesse Carter sido mais rígido, não teria o Irã tanta certeza de que pode infringir as normas internacionais sem qualquer risco de retaliação. E infelizmente outros, além dos nossos criminalistas, deixaram de lado o conselho.

O Primeiro-Ministro inglês demorou três dias para dizer que a detenção era “errada e injustificável”. A Secretária de Assuntos Externos, Margaret Beckett, declarou que o incidente deixou o Governo “chocado”. So far, não mais que isso. As Nações Unidas e a União Européia também fraquejaram além do que seria admissível, e sua postura serve para questionar qual a razão de ser dos organismos de mediação internacionais.

Há exatos 25 anos tropas argentinas invadiram as Ilhas Falkland e as Ilhas Geórgia do Sul e Sandwich do Sul. Confrontada com a agressão à soberania de seu país, a Primeira-Ministra Margaret Thatcher não demonstrou hesitação. A agressão tinha de ser combatida e seu povo tinha de ser defendido.

Mais de 900 baixas garantiram ao Reino Unido a manutenção do domínio sobre as ilhas. A Argentina ainda reclama as “Malvinas”, mas é certo que não arriscariam outra aventura militar contra quem quer que fosse.

No Irã, no entanto, há outra razão para tanta ousadia, além do histórico de vitórias dessa atitude. O fracasso da coalizão anglo-americana no Iraque colocou abaixo o poder diplomático das potências ocidentais naquela região.

As negociações tornaram-se meras encenações no plenário da ONU. Diplomacia é válido, mas não se leva a sério quem não tem umas boas divisões para garantir suas vontades. As ditaduras continuarão a dar de ombros para as críticas aos seus regimes, na certeza de que não há risco de ser importunadas. Agora, nenhuma potência ocidental pode recorrer à intimidação para manter o mínimo de civilidade nas nações mais atrasadas do globo, pois logo há de aparecer um idiota pulando na frente: “Iraque, Iraque, lembre do Iraque, companheiro”...

Um comentário:

Omar disse...

Não entendi muito bem qual a intenção do "blogue" - como vc diz - parece ser "metralhar" de forma vil, os q pensam de modo diferente de vc. É isso?