Gilles Gomes de Araújo Ferreira

segunda-feira, 4 de setembro de 2006

Um desabafo pessimista.

"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto...

Ruy Barbosa de Oliveira (1849 – 1923)



Disse o Presidente, há alguns meses, que “ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética” do que ele. Diz a oposição que este é o governo mais corrupto da História da República. Diz a situação que a corrupção sempre existiu, e que só agora está sendo revelada. Ninguém se atreve a negar que a maioria dos políticos é corrupta. Exceto os políticos. Original ou orgânica, ela existe. E persiste. É interessante notar, no entanto, como a maioria das pessoas prefere ignorar que os políticos são parte da mesma sociedade que elas.

Políticos – acredite! – não caem do céu, não dão em árvores, nem se multiplicam por brotamento. É mais cômodo, no entanto, estranhar qualquer tipo de similaridade entre nós – os virtuosos – e eles – os imorais. Bruno Ganz foi severamente criticado pelos críticos alemães por retratar Adolf Hitler como um homem com paixões, sonhos, angústias, e decepções. Hitler não era uma divindade sobrenatural. A humanização do monstro aproximou-o das pessoas, e fez com que elas se identificassem. Reação semelhante – guardadas as proporções – faz-se presente aqui. Não é cômodo sugerir que um mensaleiro ou um sanguessuga compartilhe do mesmo caráter – e das falhas dele – que a maioria das pessoas. Lembrando Jean-Paul Sartre, “o inferno são os outros”.

Disse na quarta-feira o Senador Jefferson Peres que os eleitores de Luiz Inácio “compactuam com isso porque são iguais, se não piores. É a declaração pública, solene, histórica do povo brasileiro de que desvios éticos de governantes não têm importância”. Seria exagero dizer, então, que a ética – ou a falta dela – ultrapassa a questão política? É certo que não. Isso não significa, no entanto, que a falcatrua deva ser desconsiderada. Um crime não deixa de ser crime só porque, nas palavras de um Presidente em Paris, “é feito sistematicamente”. Mas dá espaço para uma provocação: em se tratando de ética, quem poderia, confortavelmente, estar na posição de atirar a primeira pedra?

Dêem-me aquele que nunca sonegou, nunca subornou, nunca fraudou, nunca perjurou, nunca corrompeu. E eu lhes darei as vaias retumbantes da multidão. “É um tolo”. Lamentemos, não é só o Rei quem está nu. Nossa defesa, então, é discriminar nossos desvios dos desvios deles. E a alegada diferença se dá, na maioria dos casos, no âmbito dos valores. Não os valores morais ou éticos, mas aqueles que servem para alguma coisa. O que é uma trapaça de alguns poucos reais comparada aos bilhões envolvidos na corrupção?

Dessa forma, não estaria errado o deputado mensaleiro que alegou que não poderia ser cassado porque só havia ficado com quarenta mil reais. Ou a juíza do Rio de Janeiro que absolveu o ex-Governador justificando que “em tempos de mensalão, trezentos mil reais” não poderiam ser levados a sério. Nada nos separa deles.

Sir Winston Churchill, lá se vão alguns anos, abordou uma mulher perguntando, “Senhora, se deitaria comigo por cinco milhões de libras?” “Acredito que sim”, respondeu ela. “Senhora, dormiria comigo por cinco libras?”, replicou o bulldog inglês. “Ora, que tipo de mulher pensa que sou?” “Senhora, isso nós dois já sabemos. Só quero saber quanto isso vai me custar”...

Kyrie Eleison.

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