Gilles Gomes de Araújo Ferreira

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Fecha-te, Sésamo

A União Democrática de Centro (UDC) é o partido mais votado das eleições legislativas suíças, conquistando 30% dos votos e 62 cadeiras no Conselho Nacional. Os expertos em prescrever receitas para fazer o mundo um lugar melhor fazem beicinho, “assim não pode!”.
Não foi surpresa: a UDC já era o maior partido da câmara baixa. O motivo de tanta comoção é que a União não só manteve a maioria como a ampliou – a maior vantagem eleitoral desde a Primeira Guerra – ao mesmo tempo em que a UDC adotou um discurso mais direto em relação à imigração.

Extrema direita, ultradireita, antiimigrante, xenófobo, racista. Não houve, no Brasil nem no exterior, quem não se valesse de ao menos um destes adjetivos para caracterizar a UDC. E no entanto, a principal proposta do partido, a deportação de estrangeiros condenados pela justiça, não tem bases racistas ou populistas, mas está ancoradas em números oficiais.

Os estrangeiros são atualmente 22% da população do país. No entanto, eles cometem 85,5% dos estupros, 66% dos crimes de extorsão, 55,5% dos homicídios e quase 50% dos assaltos. Em 2001 a proporção de asilados que cometem crimes é 12 vezes maior do que o número de suíços natos criminosos. Apenas 30% dos ocupantes das prisões da Suíça nasceram no país.

Mas tem mais: a vitória de um partido que tem restrições à imigração como principal plataforma num país em que conceder asilos e receber imigrantes é uma tradição é simbólica dos ventos de mudança que agora sopram na Europa. A preocupação com a imigração em massa deixou de ser exclusiva de reacionários sulistas americanos para ocupar o espaço central das discussões políticas das sociedades ilustradas do velho mundo.

Da tradicional Espanha à liberal Suécia, da racional França à sentimental Itália, cada vez mais as populações nativas demonstram desconforto com os povos recém-chegados. E se a princípio tais preocupações giravam em torno de conceitos abstratos, mas não menos legítimos, como identidade e unidade nacionais, hoje a inquietação está baseada em noções cada vez mais concretas, logo cada vez mais fáceis de serem percebidas.

Nenhum país abraçou com mais afã a noção de politicamente correto do que a Suécia. Desde o final do século XIX o país tornou-se campo de provas da esquerda liberal. Afirmava-se à época que “se não funcionar na Suécia, não irá em nenhum outro lugar”. Depois, aplicavam-se as mesmas medidas em outros países do mundo com o argumento de que na Suécia, a ponta de lança da civilização, assim havia sido feito. Com o multiculturalismo foi assim. E para os suecos, que gostam de brincar de consenso, está cada vez mais difícil fingir que não existe problema com seus imigrantes.

Em Malmö, no sul, eles somam um terço da população, e 90% deles vivem sob o famigerado Estado de Bem-Estar Social sueco. Na escola local, Rosengrad, apenas 2 dos 1.000 alunos são suecos. Em 2004, o número registrado de roubos aumentou 50%, e a polícia agora tem de lidar com gangues de jovens muçulmanos especializadas em atacar idosos. O número de “estupros por emboscada”, termo do Chefe de Estatísticas da polícia de Malmö, mais que dobrou, um aumento causado principalmente por jovens muçulmanos que atacam as “vadias”, ou seja, aquelas que não seguem os costumes islâmicos.

No resto da Escandinávia não é diferente. O número de estupros também dobrou em Oslo. Na Noruega e na Dinamarca, dois terços dos detidos por esse tipo de crime são de “origem étnica não-ocidental”, ainda que eles somem menos de 5% da população. Na Dinamarca, todos os estupros grupais nos últimos anos foram cometidos por imigrantes ou refugiados.


O problema da criminalidade fica ainda mais difícil de ser resolvido quando se sabe que a polícia não se atreve a entrar em regiões de maioria muçulmana. “Se estacionarmos nosso carro, sabemos que ele será incendiado – por isso sempre temos que ir em dois carros, um protegendo o outro”, diz um policial, Rolf Landgreen. A violência não é dirigida apenas a viaturas, mas também a ambulâncias. Enfim um motivo para nos orgulhar: estado paralelo é coisa de primeiro mundo. Não é mais exclusividade nossa; e também não está restrita à Suécia.

Na França de Nicolas Sarkozy a polícia também resiste em entrar naquelas que estão sendo chamadas na Europa de Áreas Urbanas Sensíveis. Em tais regiões a sharia substitui as estruturas jurídicas estatais. Como se fosse preciso. Cada vez mais as cortes de justiça estão legitimando a lei maometana.

Na Grã-Bretanha, por exemplo, o juiz-chefe da Corte Criminal Central de Londres, Peter Beaumont, anunciou antes de um julgamento que “por razões óbvias, quaisquer membros do júri seguidores da fé judaica ou hindu devem se revelar, mesmo se forem casados com uma judia ou uma hindu, porque não são apropriados para julgar este caso”. As “razões óbvias” são que pelas leis islâmicas, um infiel não pode julgar, nem mesmo testemunhar contra um muçulmano.

Na Bélgica, o dono de um restaurante armênio viu seu estabelecimento ser saqueado por jovens turcos enquanto a polícia assistia impávida à cena. Dias antes, um jornalista belga de etnia turca foi atacado por jovens também turcos em frente à embaixada americana. Ele foi pego depois que um policial impediu que ele se abrigasse em sua viatura. Não é difícil entender porquê.

Desde a semana passada jovens muçulmanos têm enfrentado a polícia e incendiado carros nas ruas de Amsterdã. Os distúrbios começaram quando uma policial atirou e matou um marroquino que a ameaçava com uma faca. Ela e uma colega foram espancadas e por pouco escaparam da morte. O que os incomoda é o fato de que um deles foi morto por uma infiel. O marroquino, Bilal Bajaka, era amigo pessoal de Mohammed Bouyeri, assassino do cineasta Theo Van Gogh, e irmão do líder de um grupo preso há dois anos por tentar explodir um Boeing no aeroporto de Amsterdã. Os incidentes têm sido pouquíssimo noticiados fora da Holanda.

A disposição em agradar, ou pelo menos não incomodar, as populações islâmicas têm ultrapassado as raias do surrealismo. Ainda este mês o supervisor de um aeroporto de Londres foi suspenso depois de ofender um muçulmano ao pendurar uma imagem do Sagrado Coração de Jesus em seu escritório.

A atitude européia passou de condescendência à submissão, uma mudança ilustrada pelo (tomem fôlego) ex-Ministro para Democracia, Assuntos Metropolitanos, Integração e Igualdade de Gênero Jens Orback, “Temos de ser abertos e tolerantes em relação aos muçulmanos porque, quando eles forem maioria, eles agirão dessa forma em relação a nós.” Além do que se pode chamar, no mínimo, de ingenuidade, a fala do então ministro revela qual é a verdadeira preocupação dos europeus em relação ao futuro, preocupação expressada pelo Ministro da Justiça da Holanda, Piet Hein Donner. “Se dois terços de toda a Holanda amanhã quiserem introduzir a sharia, isso seria possível. Como impedir isso legalmente? De todo modo, seria um escândalo dizer que 'isso não é permitido!' A maioria manda. É essa a essência da democracia”.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Fábula

Bebia água no Vístula um cordeiro
chamado Baranówicz, quando um lobo,
coronel Wolfgang, veio e, sobranceiro,
lhe disse:

– Você pensa que sou bobo,
que eu não o vejo envenenando o rio
há muitos anos e espalhando a Peste?

– Mas nós morremos séculos a fio,
também de causa igual.

– Não me moleste
com esse irrelevante pormenor.
Vocês são todos ricos e eu sou pobre.

– Como sou rico se não tenho cobre?
Os Senhores controlam a maior
empresa, enquanto eu estou desempregado.

– Você conspira e apóia, do outro lado
do Vístula, o inimigo. Não insista,
capitalista-ovino-bolchevista.

– Mas os ursos de lá, seus caros primos,
nos comem com desculpa semelhante...

– Você, cosmopolita como vimos,
não é nada ariano.

– Como assim?
Perdoe-me, não queria ser pedante,
mas aries é carneiro em bom latim.

– Sei disso e, embora seja um lobo culto,
um Kulturwolf, não lhe darei indulto
porque vocês mataram Jesus Cristo.

– Foi a loba romana que fez isto
e mesmo que um cordeiro fosse o algoz
de quem, como Agnus Dei, era um de nós,
seria assunto nosso.

– Ovino arisco
e cínico, já chega de pilhéria.
Ordens se cumprem: vamos, pois no aprisco
de Oswiécin há trabalho que libera.
Farei, após havê-lo tosquiado,
com sua pele de cordeiro um manto
para aquecer-me neste inverno enquanto
nós lobos conquistamos Stalingrado.

Desprezando os balidos derradeiros
de Baranówicz - livres dos cordeiros! -,
os outros ruminantes, todavia,
passavam perto sem perder a calma.
Wolfgang, formando-se em filosofia
anos depois (com a tese acerca D'Alma
Lupina e seu Transcendental Destino),
reingressou, pela esquerda, na política
(não sem antes fazer sua autocrítica)
para conter o imperialismo ovino.

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Nelson Ascher, em Algo de Sol.

Margaret Thatcher defende o Liberalismo



I believe passionately that people have a right, by their own efforts, to benefit their own families; so we've taken down taxation. It doesn't matter to me who you are or what your background is. If you want to use your own efforts to work harder, yes I'm with you! All the way.

Nem a favor, nem contra; muito pelo contrário

450 mil mortos. 2,5 milhões de refugiados. Vilarejos incendiados. Estupros em massa. Rapto de crianças. Contaminação de fontes de água. Em Darfur, no Sudão, o maior desastre humanitário desde Ruanda. Desde 2003 uma milícia árabe, os janjawid, persegue, tortura e mata a população negra sudanesa. Apesar de negar publicamente, o Governo do Sudão oferece apoio financeiro e tático aos milicianos, e não raro, participa de ataques conjuntos.

Darfur é uma tragédia e a comunidade internacional deve trabalhar para que a desgraça chegue ao fim. É o que dizem os Estados Unidos, a Grã-Bretanha, a Alemanha, a França, a Espanha e o resto da Europa, o Canadá, a Austrália e Israel. É o que pedem as Nações Unidas, a União Africana, a Anistia Internacional, os Médicos Sem Fronteiras e o Tribunal Penal Internacional. Em 2004 o Conselho de Segurança da ONU se reuniu para emitir uma condenação formal ao país. O Brasil era um dos membros rotativos do Conselho. E votou contra a condenação. Ficou ao lado de China, Paquistão e Argélia. O representante brasileiro na ONU, Ronaldo Sardemberg, disse que o Brasil prefere dar mais tempo ao Sudão. Mais de 10.000 pessoas morrem por mês em Darfur.

A Birmânia, ou Mianmar, é há mais de quarenta anos governada por uma junta militar. No final de setembro um grupo de monges – que têm status de semi-divindade em um país profundamente religioso – marcharam pela capital em um protesto contra o regime militar. No dia seguinte, foram acompanhados por 100.000 pessoas. Em resposta, tropas atiraram contra manifestantes, o acesso a telefones e à internet foi limitado e o toque de recolher foi decretado.
De Nova Iorque, onde acontecia a 62ª Assembléia Geral das Nações Unidas, vários países lançaram críticas ao regime birmanês. O Presidente George W. Bush impôs novas sanções ao país. O Primeiro-Ministro Gordon Brown pediu eleições livres. O Itamaraty limitou-se a lamentar e declarar que espera que “uma solução seja alcançada por meio do diálogo entre as Partes (sic)”. Na última vez que manifestantes protestaram por democracia na Birmânia, em 1988, 3.000 foram mortos por tropas militares.

Na mesma Assembléia, o Presidente Luiz Inácio saiu em defesa do programa nuclear iraniano. Para Lula, o Irã tem direito de enriquecer urânio “como uma coisa pacífica, como o Brasil faz”. Lula não explicou qual a utilidade do urânio “como uma coisa pacífica” para um país sentado sobre a maior reserva de gás natural e a 2ª maior reserva de petróleo de mundo. Lula também perdeu a oportunidade de deixar claras outras diferenças – as que realmente importam – entre nós e Teerã. De dizer que ao contrário dos aiatolás, o Brasil não tem inimigos declarados, nem desejou que um país fosse “riscado do mapa”, nem financia tropas rebeldes em outros países, nem mantém um regime de exceção, nem menospreza os direitos individuais. Como Presidente da República, cabe a Luiz Inácio a defesa das instituições brasileiras. Ele preferiu, ao contrário, rebaixar seu país ao patamar de uma teocracia autoritária.

O serviço diplomático brasileiro carrega uma tradição de eficiência e discrição. Nos últimos anos, perdeu os dois. O Itamaraty ainda dispõe de excelência em seus quadros. O problema é que ninguém responde “bom dia” antes de autorizado por Brasília. Se as recentes decisões tomadas pelo Brasil no cenário internacional são difíceis de entender, o contrário acontece em relação às razões por trás delas. Não é recente a ambição por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança. Recente é a forma com que se tenta tornar real esse desejo. Ao invés de justificar o propósito com coragem e mérito, prefere-se agora atirar os escrúpulos às favas para prestar favores, esforçando-se para ganhar a simpatia de um bando de esfarrapados. Não deveria surpreender: esse é o jeito petista de fazer política.

“A atitude do Brasil pode ajudar muito nos negócios”, afirmou um diretor do Ministério das Finanças sudanês ao Estado de S. Paulo. Para um país que começa a se acostumar a medir o sucesso de sua diplomacia pelos índices da balança comercial, com um Presidente que compara suas visitas ao exterior às de um caixeiro viajante, fica a dúvida sobre se a “neutralidade” adotada será abandonada tão logo o Conselho seja reformado. Não; porque o que o Brasil pratica não é neutralidade, mas bisonha timidez.

A neutralidade, inventada pelos suíços no século XVI, tinha um propósito interno. O Estado não se achava no direito de representar a opinião de seus cidadãos, uma vez que elas não eram comuns. E se a intenção é ser neutro, pra quê tanto afã em conquistar poder de decisão? Só pra satisfazer a vaidade dos que não perdem a oportunidade de se proclamarem estadistas?

Até hoje as FARC não são reconhecidas como um grupo terrorista, apesar de repetidos pedidos do Governo colombiano. E esta não é uma falta que começou neste governo. Fernando Henrique condecorou Fujimori, e tentou justificar o terrorismo poucos dias depois de 11 de Setembro, ao mesmo tempo que condenava os atentados. Não é que o Brasil decida errado; o Brasil não decide. É o Sr. Eco, tentando ao mesmo tempo agradar a Deus e a Mamon. E quem fica no meio da estrada, dizia Margaret Thatcher, acaba atropelado pelos dois lados.

Regresso

Sim, estamos de volta!